Todos os problemas do mundo são causados pelo homem, era o que Evandro dizia a si mesmo naquela fria manhã de junho. Há tempos refletia sobre a vida. Sua única conclusão foi de que não existe mal maior que o ser humano. Tendo achado o problema, bastava aniquilá-lo.
Sendo o único morador de uma casa com cinco cômodos, em uma rua num lugar distante, quase desabitado, sentia-se feliz, solitário. Tinha aprendido a não conviver com ninguém. Sexo, abstera-se disso. Sem pessoas, sem confusão, esse era seu lema. Porteiro de um prédio no centro da cidade precisava sorrir aos moradores toda vez que os via, mas isso era demais, ele odiava a humanidade. Como ser amável com eles, se perguntava. Passavam por ele: Bom-dia, Vandão! – assim o chamavam – e o coitado, em sua luta interior, forçando um sorriso, respondia com alegria fingida. Às vezes, depois do serviço, quando a noite apagava o dia, debruçado na janela de seu quarto a observar as estrelas, ele sonhava com uma bomba atômica caindo sobre o planeta, exterminando-o. Seria maravilhoso, falava em suspiros.
Ao acordar naquele dia de inverno, uma idéia lhe perturbava. Levantou-se do leito e não o arrumou como de costume. Preparou café e bolo de fubá, sua refeição predileta. Pôs a mesa. Sentou-se na cadeira da ponta e serviu-se. As outras cadeiras, vazias, o olhavam com tristeza. Depois, de barriga cheia, murmurou uma reza que ecoou por todos os cantos da casa. Vestiu um sobretudo preto, colocou uma toca na cabeça, pegou sua arma na gaveta e partiu em marcha fúnebre.
Em frente à escola, um sujeito espreitava. Muitas mães aguardavam seus filhos. Quem é ele, e o que quer, indagavam. Soou o sinal da saída. As crianças apareceram sorrindo no portão. Um homem, empunhando um revólver, precipita-se na direção delas. Desespero. Gritaria. O sujeito, numa atitude inexplicável, atira nove vezes para o alto e se afasta, chorando.
Flávio Soares