Às onze da noite, o telefone tocou. Diogo não conversava com seus parentes, tampouco tinha amigos, por isso nunca recebia telefonemas. Possuía telefone só para emergências. Odiava falar com alguém sem olhar nos olhos. Aquela ligação inesperada interrompeu seu sono. Ao ouvir o ring, pensou em não atender, porém o toque não cessava. "Deve ser importante", pensou. Levantou-se. Caminhou, irritado, até o aparelho. Pegou o gancho. "Alô", bufou.
- Por que me evita? - perguntou uma jovem voz feminina.
- Creio que houve um engano, moça.
- Não banque o esperto. Estou te procurando há semanas. Por onde andou?
- Tem certeza de que sabe com quem está falando?
- Não me venha com seus sarcasmos!
- Tudo bem. Não precisa gritar.
- Estou triste...
Ele já tencionava desligar, mas, devido ao timbre dolente dela, sentiu-se apanhado por um misto de comoção e curiosidade. Concluíra que a coitada, de fato, pensava que ele era outra pessoa. Sem saber por que, deu corda na situação:
- Me desculpe, linda.
- É só isso que tem a dizer?
- O que quer que eu diga, amor?
- Ora essa! Me abandona sem qualquer razão e só pede desculpas. Exijo explicações.
- Estive muito ocupado.
- Com o quê?
- Complicações.
O rapaz não achava mais jeito de manter a conversa. Estava prestes a contar a verdade, dizer que ela tinha discado o número errado, que ele nem sequer tinha namorada. Esperou que a garota dissesse algo. Houve alguns segundos de silêncio e uns soluços vindos do outro lado da linha que o perturbaram.
- Eu quero te ver. - chorou ela.
Enternecido, Diogo a consolou dizendo que não havia motivo para tristeza. Prometeu visitá-la quando amanhecesse. Disse algumas palavras típicas de namorado apaixonado e desligou. Em seguida, retomou o sono. Sonhou que não era Diogo.
Flávio Soares